quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

A falta, a insolação, o vazio e o amor.

Não escrevo sobre a falta, porque não posso.
E não é porque ela me falta, mas sim porque
Não sei de fato se preciso dela
Enquanto ao amor?
Esse sempre aparece mesmo quando não deveria
Mas ultimamente, to começando a crer
Que se confunde amor com qualquer coisa
Menos com ele mesmo
Até com efeitos da insolação
Sim, insolação que reproduz amor
Aquele calor que te toma á pele
Induz aquela fornicação por entre a carne e os ossos
Te provoca febre até lhe assolar a ordem das coisas
E quando nos damos conta
Estamos delirando, meio embriagados de sol
E sentindo aquela euforia que achamos ser amor.
Mas não é.
Mesmo que os dois, digo
Insolação e amor
Nos deixe manchas, não se pode confundir
Os efeitos de exposição ao sol,
Com os efeitos de exposição á alguém
Porque de fato
Só nos permitimos sentir,
A bendita radiação da pele ou radiação do ser
Porque nos expomos,
Caso contrario
Não sentiríamos nada que não
O eco da nossa própria existência
Ou na mais exagerada das hipóteses
Sentiríamos o vazio.
E esse sim nós corrói mais que a falta.
E não devemos ainda confundir a falta com o vazio
Mesmo que ambos sejam derivados da ausência
A falta, é sentir carência de algo que se sabe ou não o que é
Já o vazio, é não sentir nada
E ainda sim sentir esse não-sentimento
Não sei porque me prolongo
Aumentando linhas estampadas de letras
Teorizar sobre tal assunto,
Já não conclui mais nada
De qualquer forma
Ainda temos a insolação.

Guilherme Radonni

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Engolindo as nuvens...

Garganta arranhada
Inflamada de ego talvez
Ainda sim, podia sentir as nuvens
Me descendo goela abaixo
Nunca pensei que poderia engolir o céu
E de fato não posso
Trago somente as nuvens
Cinzentas, com gosto de boemia
Em meio o vermelho da boca
O branco do filtro
Saliva e fumaça
Talvez um pouco de angustia também
Mas logo some, chega aquele leve bem estar
De quando se é novo ou velho de mais
Pra saber o que é
Talvez porque seja pela garganta
Se fosse pelas veias seria mais...
Narcótico
Um trago pra consciência
Mais um maço talvez
Agente nunca sabe quando acaba
Vamos, você e o seus últimos vinte amigos
Tem fogo? Isqueiro ao menos?
Brasa talvez?
Você que ascenda tua juventude em outro canto
Em outra boca,
Na minha não, já basta o tabaco
Pra adormecer minha língua
Me cortar as gengivas
E fazer fumaça em água.
Foi assim, começou por terceiros
Depois veio a curiosidade,
Quando percebi
Lá estava eu, segurando com os dedos
Levando até o lábio, puxando o fôlego,
E sentindo as nuvens me descer
A garganta, chegando ao estomago
E se subdividindo pelo resto
Nicotina e sangue.
Combinam mais que inocência e vício.
Não me contento mais com o leve bem estar
Agora mastigo as nuvens
Pra que elas não me mastiguem
De qualquer maneira
Continuo tentando engolir o céu.

Guilherme Radonni

sábado, 26 de dezembro de 2009

Suplica.

Mesmo eu não crendo no tempo cronológico
Criado pelos homens, e ditado pelos ponteiros do relógio
O passar das horas sem você me sufoca
Já não suporto um minuto se quer sem tua presença
E sim, digo pelo tempo dos homens
Por cada passar de hora
Em que teu cheiro não me toma os dedos
Em cada segundo gasto
Em que minhas pupilas não enxergam teus rastros
Confesso,
Tenho medo de não te encontrar mais
Durante a nossa insônia ofegante
Tenho medo de te deixar
Sem antes contar todas as pintas
Que estão esparramadas sobre teu corpo
Sem ordem ou conjuntura
E também tenho medo
De não te assistir uma última vez
Dormindo sobre os meus ombros
Naquele sono fora de hora.
Pra cessar esse medo, suplico
Foge comigo, pra bem longe do tempo
Pra qualquer lugar que não a realidade
Onde deitar no verde e fazer fotossíntese
Seja a nossa única rotina,
E ensaboar tuas costas no chuveiro frente ao espelho
Seja tão necessário, quanto à gravidade.
Por estes e outros motivos
Não me deixe só
E não é porque tenho medo do escuro
Até mesmo porque não tenho
Mas sim porque preciso da tua presença
Esparramada sobre minhas horas
Sem órbita ou eixo
Apenas esparramada
Que mais se quer que deitar na janela ao teu lado e ver o céu?
Nada, não preciso de mais nada que não isso.

(Você sabe que esses versos são para você).

Guilherme Radonni

Valsa aos enfermos que sofrem de amor.

Que doença tola essa que chamamos de amor
Enfermidade mais medíocre não há
Primeiro nos devora os anseios
Nos preenche as lacunas
Faz o cinza parecer vermelho
Só para depois nos esvaziar de tudo que nos trouxe
O amor, esse que não se vende em mercearia
Me digeriu em pedaços imperfeitos
Me afogou em minha própria alegria
E não satisfeito, sufocou ainda meu fôlego e minha asma
Sim, ainda tenho asma, aquela velha asma
Que não me deixava quando pequenino
Correr sem rumo pelas calçadas
Nem dançar tanto tempo sem sentir aquela aperto
Mais agora acho que mudou de nome
Ou pelo menos de motivo
Essa asma que eu sinto no peito
Agora é sufoco de amor,
Amor incurável,
Que devora até as bulas e as receitas médicas
E pra esse mal não existe cura
Não existe remédios, nem homeopatia
Nem sequer reza, milagre ou curandeiro.
Resta-me padecer
Esperar que o amor coma o fim dos meus dias
Mastigue minhas últimas horas
E engula o término de meus minutos.
Assino então minha falência
Minha desistência,
Minha eutanásia.
E confesso, prefiro morrer deste tumor no peito
Que chamamos de amor
Do que viver sem tal doença
Do que ser saudável perante o vazio
Do que ter assinado no atestado de óbito
Solidão.

Guilherme Radonni.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Á nossa insônia...

Ainda não entendo se é de verdade
Ou se é tudo ilusório.
Começou com prosas trocadas
Em meio da insônia compartilhada
E logo um enxame de mariposas
Invadiu-me o estomago
Simulando uma valsa cuja música
Era uma só, tua voz.
Descobrimos ainda o quão parecido somos
No tamanho das mãos, no dia do aniversário,
Na impaciência e nos calos dos pés.
Coincidência? Parece que não
Creio que deveria ser assim.
Nos conhecemos então
Eu no palco, você na platéia
Eu paciente, você visitante
Foram nessas condições que os enfermeiros
Chegaram anunciando; “Hora da visita”.
Colocaram-me frente a ti,
E ali nos olhamos durante os melhores cinco minutos
Do espetáculo, teu olhar me deixou inquieto,
Não sabia ao certo quem havia se encantado
O personagem ou ator
No final você ganhou os dois
E agora depois do passar das horas
A tua falta me falta
E o meu ar fica sem fôlego
Só preciso da tua prosa
Do teu afago
Do teu conforto
Insano tudo isso,
Ainda sim não quero me curar de tal insanidade
Pois já admiro até o riso sem jeito
De quando te olho por tempo demais
E dessa vez não é o ator, nem o bailarino nem mesmo eu
È o meu peito que grita teu nome,
Que deseja calar tua fome, que te quer até de madrugada
Pois contigo as horas se comprimem, e um dia vira um minuto
Foge comigo pra Lua,
Pra qualquer lugar que não a realidade
E da eternidade só espero uma única coisa,
Você.

(Dedico aquele com quem pretendo passar o resto dos meus dias. R)

Guilherme Radonni

domingo, 6 de dezembro de 2009

Paciente 254-06

Enfermeira entra, marchando com seu sapato branco de salto quadrado
A inquietação do paciente não é mais forte que a camisa que o prende
Mordaça de gente, carcere de surrealidade
Depois dos gritos abafados, a sanidade estampada de branco
Profere teu discurso em tom de enumeração
Escrito em qualquer prancheta e folha amarelada.
"O paciente sofre de sindrome traumatica pós infância
Esquizofrenia, disturbios do sono, disfunção taquicardiaca muscular
Transtorno fonológico, psicose induzida, disfunção perceptiva
Delirio auditivo e variação de depressão crônica.
Agora vê o que vocês fazem com esse dai,
Que parece que vai dar trabalho
Vou tomar um café."

(trecho do texto, Memórias de um Manicômio)

Guilherme Radonni

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Sem Título

(Intervenção do terceiro sentido)


Foda-se
Como se anti-matéria fosse uma felicidade resistente a imaginação da mitologia
Do objetivo de encarar a hora do rush sem pestanejar,
Ou a mitologia do subjetivo que os realmente sãos
Tem em suas mãos,mas nem a um terço de suas proles conseguirá
Ter importância e se forem...morrerão jovens.
Assim como nós.
Sabe-se da manhã sofrida de dentro de si
Para dentro do quase atingível
Onde perdera-se o norte e apenas a areia grita seu nome,
As salas de mármore morrem dentro de ti,
Então fica atravessada você
No ciclo maldito do campo de concentração juvenil,
Atravessara e transpassara.
O bicho pega, se a massa entrar e se não entrar,
Que será? qual será?
Talvez não conseguiremos ir contra os coronéis de Sam
E o falo crucificado volte.
E você fique apenas anotando, anotando, anotando
As bobagens selvagens e perigosas.
Sorria à esta transfiguração então, ao menos trará o domínio.
Perturbará os cotidianos e neuroses alheias. Foda-se.
E que ela não faça o que seu útero obrigue ,
E aqui dentro permaneça, apenas.
Apenas.
Como diz mais um velho embriagado
"De que me vale ser filho da santa,
antes eu fosse filho da outra".



Ísis Rodrigues

(o discurso que invade a eles invade a mim)

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Oceano claustrofóbico

(Dentre os mares de gente que mergulhamos a cada dia, o meu mar intoleravelmente me sufoca)
Falta ar, ou qualquer coisa parecida
Só sei que o espaço dentro de mim
É maior do que eu suporto
E menor do que eu preciso
Tudo por um instante parece claustrofóbico
Como se o mar tivesse me afogado antes de eu vê-lo
Ou sentir o cheiro da areia, do sal ou do azul
E ainda sim, ele não me levou
Minha carne ainda existe, ainda me sobra
Me obriga arrasta-la enquanto minha ulcera me corroe
E ai percebo, é só tua ausência, tua falta
Tua inexistência
Nunca te procurei,
Mesmo quando era somente de ti que eu precisava
Mais não sei encontra-lo
Em outro lugar que não no meu autismo
Esse autismo que me devora aos poucos
E que não lhe serve,
A insônia ainda atordoa os olhos que pesam à cansaço
E o motivo porque não durmo, é simples
Medo de se afogar, ou pior que isso
Medo de você passar e eu não o ver
E se não te encontro nesta vida, o que fazer?
Já pensei em algumas formas de acabar com tudo
Sempre fui meio piromaníaco incendiário
Mais dessa vez, nem queimar os dias os fariam passar
Pois as cinzas das horas pesam mais que a realidade
E não sei se os meus joelhos vão aguentar
Qualquer peso a mais que a tonelada que já carrega
Nessa tonelada, uma etiqueta lhe dando nome e classificação
Escrito em letras apagadas com cor de ferruge
Está o causo de todo o peso
Solidão

Guilherme Radonni


Com licença poética, como dizia Adélia...

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, sobrar?
Sobrar e esquecer,
Sobrar e enternecer,
Sobrar, faltar, desamar?
Sempre, e até de olhos vidrados, restar?
Que pode, pergunto, o ser solitário, em rotação universal,
Senão rodar também, até que a solidão o corroa
Suplicar que o mar nos afogue e que voltemos à praia,
Só para ele sepultar na areia, o que na brisa marinha,
É sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Se entregar solenemente as palmas do deserto,
Aquilo que é entrega ou adoração expectante,
E crer no inóspito, no áspero,num vaso sem flor,
Num chão de ferro, no peito inerte, e ainda na rua vista sem cor,
E numa ave que não voa.
Este é o nosso destino;
A ausência, distribuída pelas coisas,
Insuficiência ilimitada a uma completa imensidão,
E na concha vazia das sobras ser digno
De sobrar, esquecer e enternecer
Crer na nossa falta de amor,
E na nossa secura de amar os olhos próximos que não os nossos
E calar o grito, e a companhia inexistente.

(Peço desculpas a Drummond, mais meu vazio não se enquadra no simples amor que nos é dado)
Guilherme Radonni