segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Monólogo da chuva seca

Cheiro de chuva,
Cheira
Janela quebrada
Quebra
Desespero engasgado
Engasga
Mesmo assim
Minhas horas não traduzem
Fragmentos soltos, de dias presos
Por que insisto em me debruçar na janela e assistir o céu cair?
Por que insisto em escrever linhas rasgadas?
Por que?Pra que?
Lixo polifônico
Equações sem polinômios
Verso desigual
Sem métrica, estrutura ou respeito
Só essência
Indecência talvez
Mas ainda sim florescente
Abuse do discurso
Ou ao menos do impulso, porque esse sim
È avulso, é intruso
Corra, a chuva engrossa
O peito arde, e o abraço cadê?
Nem brotou ainda
O que sobrou, fugiu antes da epidemia
Meu guarda chuva esta sem espaço
Ou cabe eu, ou minha dor
Melhor ela, dor molhada incomoda ainda mais
Já a carcaça?
Seca de vez em quando
Onde estão os gigante que me carregavam nos ombros?
Lembrei, foram postos em aquários
Quem mandou dar idéia ao consumismo?
Quem mandou brincar de enxergar as coisas?
Agora a cegueira não te serve
E esta condenado a chover
Escorrer pelo resto dos dias
Enquanto teus olhos encharcados
Escorrem ao teu peito seco.
Deixei o banheiro vazando
Pra ver se a chuva para
É que ta doendo sabe
Sou bicho do sol,
Tanta chuva assim me afoga
Preciso de fotossíntese,
Laranja, vermelho e amarelo
Cinza não, esse dá vazio, da realidade
Monotonia e solidão
Vou parar de lamentar, a chuva parece cessar
Olha lá quem vem, agora sim vai acabar
O dilúvio chegou.

Guilherme Radonni.

Café.

Depois de capítulos
Resistindo e negando
Sobre o gosto obvio da cafeína
Acho que enfim, to aprendendo a gostar
Começando a entender
As bordas das xícaras
Borradas de saliva e marrom
Entender a mesa quente,
Nas manhas frias
E o sono anulado, por vicio de pó
Pó de café, pó de rotina
Pó que acostuma
Talvez nem fosse tão amargo assim
Deve ser culpa da língua precoce
Que rejeita tudo que não for glicose
Que lambe o que beija
E escarra tudo o que transborda
De qualquer jeito assisto a água ferver
Pra não ter de aplaudir minha própria evaporação
Queimo a ponta dos dedos no vapor que despejo
Sobre o bule ou qualquer coisa.
Duas colheres bastam,
Minha insônia já não é tão forte
Acho que deve dar pra afastar o sono
Ou o vácuo, ou o grito.
O grito é sempre pior
Esse dói quando não tem voz
Quando você não o tem
Ou quando já desistiu de gritar
È a vida, está gasta, e com gosto de...
Com gosto de café
Daqueles servidos pra visita sabe?
Que não se pode recusar
Tem de engolir enquanto faz sala
Mesmo que esteja amargo, queimando-te a língua
E te dando ânsia
Mais acho que estou aprendendo a gostar
Não é o que é de fato
E sim o que representa
Goles secos, prosas mudas, e café extraviado
Quando se é jovem, não se quer cafeína,
Se quer vodca, com doses de rebeldia
E gastar a madrugada de olhos abertos
Sem precisar de estimulante.
Até quando somos jovens de verdade?
Até quando resistimos ao café?
Não creio na idade cronológica
Nem na chaleira que apita o vapor sujo de costumes
Mas no final de tudo
Acho que estou aprendendo a gostar de café.

Guilherme Radonni.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Revolta de um miserável, que vende a fome pra comprar status

O que são discursos perto de fatos?
Nem sempre a demagogia de folhetim
Serve à política de bolso.
Concepção do individuo abandonado
Em qualquer calçada do desespero
Situações extremas equivalem a atitudes imorais
Irracionais, são as migalhas divididas entre bocas que tem fome
Não falo de fome material, falo de fome ideológica
Quando se esta na merda, já não faz diferença
Correr ou ficar, da na mesma.
Sabe aquelas moedas que encontramos embaixo do sofá
Quando se não tem mais nem uma nota na carteira
È meu amigo, não tem mais nada embaixo do sofá
E muito menos na carteira
A solução, é assaltar o congresso nacional
Dinheiro lavado, é dinheiro limpo
Não é?
Então vamos, vamos roubar dignidade
De quem vende sanidade nas ruas
Nos becos e nos bueiros
Deste aglomerado de gente e asfalto
Chamado São Paulo
Depois assine nosso plano de fuga
Como sem itinerário
Admito, enquanto omito
Nossa pobreza não nos torna indiferentes
Miseráveis talvez, mas ainda sim com relevância
Pois uma arma, mesmo que sem balas
Oprime na mão de qualquer um
Preto, branco, vermelho ou verde
Sem distinção de monocromia
Sem subdivisão de mediocridade
O que importa agora, é a necessidade
Escolha entre ser antropófago ou ser banquete
De qualquer modo ou de qualquer maneira
O revolver continuara sem balas
Então atire vácuo por entre as entranhas
Epílogo, sem recapitulação
Consuma tua fúria e execute-a
Quando cessar, roube qualquer carruagem de metal
E fuja pro azul
Êxodo urbano, em direção a areia, mar e sal
Lá sim, podemos nos afogar de verdade
E não de miséria
Comer o por do sol, e tragar o horizonte
Quando chegar, tire os sapatos
Pra que a sola incriminada,
Não contamine o litoral.

Guilherme Radonni.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Estofados, degraus, guerra de dedos e borboletas...

O conheci num degrau,
Em um sábado cinzento
Em meio do barulho alheio
Em uma noite onde o acaso nos permitiu
Começou com um papo desajeitado
Daquela que nos apresentou
E logo nos rendemos aquilo que seria incomensurável
Estofado, desejo, afagos e olfato
Nos ganhamos ali
Onde as mãos não se continham
E tentavam descobrir mais que o zíper das calças
Mais que o toque da pele
Mais que o arranhar da carne
Minhas mãos, apertavam as dele
As dele, me subia pela nuca
E se embrenhava no embaraçar dos meus cabelos
Logo, vinham os homens estampados de terno e gravata
E impediam o que nossos corpos suplicavam
Desconhecido, não sabia o que era aquilo
Era maior que o peito e explorava minhas extremidades em suspiros
Ao voltar a realidade, me perdi de novo,
Nos conhecemos numa segunda vez,
Em frente a um teclado e a um monitor barato
Ali ficamos, até o sono nos pesar os olhos
E permanecemos um com o outro, pelo menos em pensamento
A rotina, já não era tão sem graça
Agora havia, prosa de bolso
Trocadas e enviadas, para nos suprir da distancia
Que já não parecida tão importante.
Fugimos para o alto de um edifício, vimos a cidade ascender
Enquanto o dia se apagava, e os insetos?
Malditos insetos estampados de terno e gravata
Pela segunda vez fugimos, dessa vez para os degraus das escadas vazias
Lá, nos rendemos a vontade, trocamos mais que olhares
Enquanto aquela febre que eu não sabia o que era
Me fervia o torço, as pernas e o lábio
Foi então que tivemos certeza
Terno e gravata não gostam tanto assim da gente,
E não foi só disso que tive certeza
Descobri o quanto adorava, teu riso desajeitado no canto da boca
Quando te olhava por tempo de mais
Descobri o quanto admirava tuas mãos compridas
E incapazes de ganhar de mim
Numa batalha de dedos.
E ainda descobri o quanto fica sem graça
Quando te beijo no meio da multidão
Não é minha culpa, só preciso encostar meu lábio ao teu
Antes de ir embora e ver o vagão correr os trilhos
Sabe o que mais descobri? Descobri o que é ter borboletas no estomago.
Um enxame de mariposas me corroendo a sanidade
Me fazendo louco por ti,
Poderia escrever infinitas linhas,
Sobre você, nós ou qualquer momento que passamos juntos
Mas guardo a eternidade para o acaso
Enquanto gasto nossas horas, sem pretensão ou ilusão
Como você mesmo me previne,
Em vão, só te quero enquanto hei de querer a Lua
Nossa liberdade é o que nos deixa a vontade
Portanto mergulho sem medo em tudo que seja você
Não sofreremos uma gota se quer
Pois paixão feita em escada
Sobe degrau por degrau
Sem queda ou tropeções.

(De um bobo, para um gigante)

Guilherme Radonni.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Algumas formas de se acabar com o tédio ou com você.

Observo o assoalho,
Cerâmica, rejuntes, rodapés e poeira
Enquanto ouço o rangido de minha própria mordida
Mastigando tua ausência, engolindo o vácuo
No ângulo da parede, molduras de bolso
No ângulo do peito, cicatrizes e coagulo
Não vaze, ninguém limpara o vermelho do chão
Portanto cesse, e não vaze.
A escama do meu lábio escorre em círculos,
Em volta da borda de um copo embaçado e mal lavado
Assim como o teu rosto, sujo de sono, como quem ainda não acordou
Até lhe chamaria pra dividir a insônia e o as migalhas do café
Mais despertador não serve para acordar quem nunca existiu
Ilusão caótica,
Desmembra minha percepção
Me fazendo amar o vento
Venha, bagunça meus cabelos, tire de mim as rugas que ainda não veio
E sopre vida em minha cara,
Vamos vento me ame,
Me ame, como eu te amo
Rogo um vendaval,
Para gozar-te a carne e causar espasmos aos suspiros.
E quando voltar a ser leve brisa volto a observar o assoalho,
Formigas, carregam umas as outras
Carregam as bombas atômicas
Me carregam pro formigueiro de mim mesmo
Veneno atônico das formigas, escorregue por minhas veias
E desperte minha alergia de insetos, minha alergia imaginaria de solidão
E lhes prometo glicose, daquelas cristalizadas e tão brancas como neve.
Chega de devaneios, me ascenda um cigarro,
Tola amnésia momentânea, nunca fumei
Isso é desculpa de quem quer puxar assunto.
Sendo assim chame um pirofórico
E eu lhe apresento meu amor pelo vento e uma molécula de oxigênio
Quem sabe me inflame também,
Sempre fui meio...
Piromaníaco.

Guilherme Radonni

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Quem apagara a luz? O cone, as cadeiras, ou a rotina?

O que é rotina, quando se tem o quintal dela?
Confesso, lá estou todas as manhas,
Talvez a culpa seja do relógio,
Ou talvez seja a minha ânsia gritando de novo
Mais aquele dia, foi mais que isso
Mal abrimos as janelas, e o sol já nos invadia
Nos corrompia com todos os nossos 17 anos
Esparramados nos lençóis
E sobre a carne crua, um do outro
Nudez de bolso, e como diz ela
Cheirava a leite, coisa de criança, coisa de irmãos.
Depois cessamos nossa sessão de devaneio
E fomos ao microondas industrial
Esquentar o que move nossos estômagos
E dessa vez não era nem ulcera nem sequer azia.
Partimos para o martírio individual de cada joelho
O meu, era dançar por ai, a valsa das sapatilhas rasgadas
O dela, era dançar por ai, a valsa dos físicos e químicos.
Marchávamos para os trilhos, enquanto desejo alheio nos invadia.
A voz cansada de qualquer maquinista nos alertou
“Estação, sol, mangueira e plano de fuga
Desça agora e busque o terceiro”.
Assim fizemos, saltamos em direção aquela que nos completa
No caminho infligimos a lei
Roubamos um cone imperial, pintado de piche e outros restos
E isso foi o mais perto que chegamos de um crime,
Concluímos a via sacra, invés de cruz e humanidade
Levamos nos ombros, nossa própria loucura.
Sol, suor e sal.
Tudo esparramado no quintal,
Onde as acerolas ainda não caíram
Cachoeira produzida, fuga hídrica
Banho de mangueira, três velhos cansados,
Que nem rugas tinham.
E se a vida fosse um filme?
O nosso seria com legendas em braile
O nosso seria em vermelho e verde
O nosso seria sem final.
Começa então o jogo das três cadeiras
O ultimo a sair apague a luz
Que não seja eu, não suportaria ver metade de mim indo embora
Prevemos a nossa morte, e nos prevenimos com lágrimas e sorvete
Depois secamos,
E só restaram as cadeiras vazias
E água evaporando.

Guilherme Radonni.

A onde estão os cortadores de grama?

Eu, pobre carcaça movida a angustia que sou
Assistia a cidade acender
Enquanto o céu parecia cair
Permanecia deitado na vertical,
Era o que eu sempre fazia para não ter de escorrer
Para não ter de sangrar, ou até mesmo transbordar
Com os olhos postos nos clarões arroxeados que pintavam o céu
Eu invejava a chuva enquanto me escorava na janela
Fingindo ter afeto ou contemplação
Não adiantou, carinho não se dá em concreto
Não devem ser tão compatíveis
Pelo menos não em setembro
Mal começara o atordoante mês,
E eu já não tinha vontade, nem grana,
Esse último acho que nunca o tive
Então escorria por ai, esperando a chuva cansar
Enquanto eu restava
Assistindo da minha janela
O espetáculo dos homens pequeninos
Que daqui de cima pareciam formigas estampadas de terno e gravata
Que matavam umas as outras por cédulas verdes
Homem tolo, tem grama em tanto lugar
Porque brigam por uma sintética e de papel?
Estampada com um rosto em cada nota
E marcada com números de registro
Quem foi que catalogou a grama
E fez dela combustível pras guerras?
Não sejam tão pequeninos homens vistos da janela
Papeis verdes não curam insuficiência humana,
Papeis verdes não cessam a chuva que cai
E nem ao menos compram o que nos falta no peito.
Indignado, repouso minha mão na testa
Com qualquer tom de desespero
E desço até ao porão eufórico e aos berros
Procurando algo no meio da bagunça e da poeira.
- Mãe você viu meu cortador de grama?
- Pra que filho?
- Vou aparar a loucura dos homens!

Guilherme Radonni.