quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

O estranho.

Alguém ai?Qualquer um?
Leitor? Analfabeto que seja,
Alguém? Ninguém?
Se tiver, por favor, tira esse corpo estranho de dentro de mim
Já reclamei para família
Dizem que isso é frescura de quem não tem o que fazer
Mas eu juro que não é
Escuto um grito que não o meu, toda vez que vou escovar os dentes
E tenho calos nas mãos sendo que nunca trabalhei
Juro que tem um corpo estranho dentro de mim
Ontem fui ao médico e o Doutor disse
“No raio-x, tem duas estruturas ósseas, isso não é muito comum
É como se tivesse alguém dentro de você,
Mas no geral acho que isso é frescura de quem não tem o que fazer”.
De qualquer jeito minha pele já não é mais minha
A divido com este desconhecido,
Este outro que não eu
Este lado triste, que não sei o que faz dentro de mim.
E que quando durmo permanece acordado
E se este outro sou eu, meu sono se traduz
Em forma de insônia,
Já não durmo, não como, nem escovo os dentes
Pra evitar ouvir aquele grito no espelho
Tento conhecer este estranho dentro do meu particular
E a cada passo que dou pra dentro dele
Dou dois pra fora de mim mesmo
É como se dentro dele estivesse o externo,
Diferente do autismo que eu tinha planejado
O problema, é que este estranho esta tentando me por ao avesso
Mudar a ordem da minha genealogia
Cegar os meus olhos e amputar as minhas mãos,
Pra expor os membros dele
E aquela fome que eu tinha, já não tenho mais
Queria saber em que parte da vida
Eu mastiguei este estranho pra dentro de mim
Talvez se eu nunca tivesse tido esta fome de comer
A vida dos outros, não teria um outro dentro de mim.
Hoje de manha antes de pegar o papel e o lápis
E me sentar aqui, para fazer esta carta de socorro
Olhei bem pra dentro do espelho
E pela primeira vez, eu o enxerguei
Sim, olhei nos olhos do estranho que estava hospedado em mim
Confesso que tentei vomita-lo, não deu certo
Então o olhei de novo desta vez mais pra dentro dele do que do espelho
E perguntei a ele o que fazia dentro da minha estrutura óssea,
Perguntei que doença era essa que comia a minha identidade
O estranho respondeu,
“Essa doença é frescura de que não tem o que fazer”
Depois disso arranquei meus olhos, cortei minha língua
Amputei minhas mãos e calei minha voz.

Guilherme Radonni

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