domingo, 20 de março de 2011

Ir. Recomeçar. Partir...

O trem apitou.

É hora de ir,

e deixar o que me afaga.

Só existe a mim,

nem cenário há.

Na plataforma de colchões

não tem nenhuma alma ao menos sentada.

Eu me olho,

estou nua com um cigarro entre os lábios.

Não há ao menos vergonha.

Aquele elemento de ferro gigante se aproxima.

A grande angústia humana não cessa.

Deveria estar feliz porque vou embora,

conhecer ares de outras cores,

ver cheiros com outros sabores,

andar por céus talvez mais limpos.

Mas não...

Existe uma ansiedade por trás dessa solidão.

E uma exigência por olhos mais afetuosos,

uma cobrança por cuidados maiores.

O maldito trem azul apitou.

Disseram me uma vez que azul é a cor da partida,

acredito. Agora.

Partir é deixar se levar,

mesmo que nua

a algum lugar desconhecido.

Estou com frio agora,

e não há roupas em varais vizinhos.

O trem passa por mim,

deixa suas frestas de ar cor azul

e pára.

Desespero me toma.

Ele abre suas portas,

fumaça por entre as partes.

Fumaça em mim.

Não enxergo o lado de dentro,

mas...

Dou o primeiro passo,

me vem uma tosse azeda,

ele apita de novo.

Entro as pressas,

ele se fecha,

e...

fechou-me com ele.

Estava partindo porque me sentia presa,

e agora me vejo enfiada entre fumaças.

É uma velocidade tremenda,

olho para trás,

há uma senhora vestida de minha mãe.

Entenderam?

VESTIDA!

Ela me olha horrorizada,

abre a janela e salta do trem.

O grito do olhar dela fica:

- a garota esta nua !

Não há mais ninguém.

A fumaça cessa,

mas fica uma quentura que me avermelha.

Agora a cor daquele itinerário é vermelho,

nunca me disseram nada sobre esse tom.

E aquela agonia de ser humana não pára.

O apito de novo.

Uma pausa. Portas abertas, sem fumaça.

Lá fora há um grande deserto,

com um sol bonito queimando.

Eu corro. Sem olhar pra onde vou,

quando me viro há uma fumaça de areia que meus pés deixaram para trás.

Nem se eu quisesse voltar daria.

A areia faz cócegas em minhas pernas e tira-me sorrisos.

Tudo é laranja.

Laranja é a cor do recomeço.

Algo me faz cair,

fitar o céu que me cega

E não sentir me mais só.

Por mais que nem trem mais aja.

O céu apita.

E ele estava azul...


Tábatta Iori

Um comentário:

  1. Boa tarde! parabéns belo poema, me identifiquei com esses versos pois tudo o que mais quero e partir,ir.. abraços

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